Editorial - Clamor por justiça e respeito à dor das famílias

A execução do vidraceiro Anderson Queiroz Camargo, ocorrida em 18 de janeiro deste ano em Votorantim, exige mais do que investigações formais. Exige empatia, responsabilidade e compromisso verdadeiro das autoridades públicas com a busca da verdade.
Na última terça-feira (23), durante a realização da segunda perícia no veículo relacionado ao crime, a Polícia Técnica interrompeu o procedimento sob a alegação de interferência por parte da família da vítima. O pai de Anderson, Ronaldo Camargo, que acompanhava os trabalhos com base em orientação recebida, viu-se, mais uma vez, diante de um sistema que parece dificultar, em vez de facilitar, a obtenção de respostas.
É preciso registrar que o acompanhamento de perícias e a restituição de bens em casos criminais são práticas comuns e legítimas, voltadas à transparência e à garantia dos direitos das vítimas e de seus familiares. A perícia criminal é um instrumento técnico essencial para o esclarecimento de crimes e deve, sempre que possível, ser conduzida de forma clara e aberta à sociedade.
O Procedimento Operacional Padrão de Perícia Criminal, publicado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública, não estabelece proibição explícita para a presença de familiares ou da imprensa durante perícias realizadas em espaços públicos. A decisão de restringir ou permitir o acompanhamento cabe, sim, à equipe pericial, mas deve sempre respeitar o princípio da transparência e o direito à informação — sem confundir a dor e o legítimo anseio por justiça com interferência indevida.
Em resposta enviada à Gazeta de Votorantim, a Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo afirmou que a interrupção da perícia ocorreu porque familiares da vítima teriam interferido verbalmente nos trabalhos e realizado filmagens sem consentimento. Alegou ainda que, diante do comprometimento das condições adequadas para a perícia, a equipe optou pela interrupção e solicitou o reagendamento em ambiente controlado.
Embora seja legítimo que os peritos prezem pela integridade técnica do trabalho, a justificativa apresentada revela uma visão excessivamente restritiva da participação da sociedade em atos de interesse público. A perícia, especialmente em locais abertos, é um procedimento que deve prezar pela publicidade dos atos, garantindo transparência, especialmente em casos de alta relevância social.
A postura dos peritos, ratificada pela resposta da Secretaria, mostra um distanciamento da realidade de dor vivida pelas famílias. Abandonar o local, sem buscar alternativas para garantir a continuidade do trabalho com segurança e respeito mútuo, acaba por prejudicar não apenas a investigação, mas a credibilidade das próprias instituições.
Ronaldo Camargo, pai de Anderson, não deve desanimar diante dos obstáculos que surgem no caminho. Sua luta é também a luta por justiça e pela preservação da dignidade humana. As instituições existem para servir à sociedade e devem zelar pela confiança que lhes é depositada, especialmente em momentos de tamanha dor.
Não se busca privilégios. Busca-se apenas o que é justo: a verdade.
Que as autoridades envolvidas — da perícia à Justiça — compreendam a gravidade deste caso e reforcem seu compromisso com a transparência, a humanidade e a responsabilidade que lhes cabe.
A sociedade de Votorantim e todos que prezam pelos direitos humanos aguardam respostas. E continuarão vigilantes.
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