Cordão umbilical do crime organizado
Por José Crespo*
(Os artigos assinados não representam,
necessariamente, a opinião do jornal)
Todos conhecemos a crescente importância da
comunicação em nossa vida pessoal e coletiva.
Tudo começa com o pensamento, que é puro,
etéreo. Mas a maioria das pessoas ainda não consegue comunicar pensamentos
a outrem, e necessita utilizar-se do verbo e das várias formas de linguagem,
que são instrumentos degradados, até mesmo em boa fé.
Se considerarmos, pelo outro lado, os processos de
comunicação em má fé, com objetivo de prejudicarem o próximo e dolosamente
cometerem tudo o que a sociedade considera crimes, percebemos o quanto a
tecnologia, infelizmente, tem criado e desenvolvido ferramentas para isso, de
soft e de hardware.
Num país em que a vida é reconhecida como dom de Deus
e que não deve ser tirada pelos homens, a prisão dos criminosos é a solução
remediada na tentativa de reeducá-los ou pelo menos impedir que continuem
prejudicando terceiros.
Alguns encarcerados são pessoas de boa índole que
inadvertidamente cometeram crimes. Mas no mesmo local convivem os piores seres
humanos, gente sem quaisquer escrúpulos ou freios de comportamento, verdadeiras
bestas diabólicas.
E é natural que as pessoas se associem e se convertam
às maiorias daqueles com quem convivem.
Nesse ambiente perverso, foi apenas uma centelha para
que o mal se organizasse dentro dos presídios.
Mas de que adiantaria essa organização se ficasse
constrita àqueles muros?
A inteligente ideia foi de que, protegidos pelo
Estado, se aliassem ali os comandantes do crime e dali distribuíssem ordens a
todas as quadrilhas externas, que atuam fora daquelas muralhas. Mas para que
isso funcionasse era necessário que tivessem uma eficaz tecnologia de
comunicação, os celulares.
Hoje existem dentro dos presídios, mais aparelhos
celulares do que o número de detentos.
Em 1996, já poderosos, mas descontentes, os chefes do
crime organizado, dentro dos presídios, mandaram os de fora assassinar, em
poucos dias, uma lista de policiais e autoridades. Sentindo-se perdidos, sem
defesa, os governos cederam e fizeram um acordo de conveniências que perdura
até hoje.
Mas com isso o crime se organizou ainda mais, e
amealhou fortunas maiores do que o orçamento de muitos países.
O próximo passo, com todo esse dinheiro, era
selecionar, pagar os estudos e infiltrar jovens em todos os setores das
instituições nacionais, ficando latentes, mas cientes de agir quando convocados.
É o que explica o que estamos sofrendo atualmente, com
decisões de outra forma inexplicáveis cometidas pelas maiores autoridades
nacionais; as faturas do crime organizado chegaram aos três poderes da
república. Trata-se de pagá-las ou morrer – simples assim (rito sumário dos
tribunais do crime).
Mas solução para esse desastre social existe, se ainda
houver um punhado de homens livres e de bons costumes em alguma
repartição.
Há mais de 20 anos fala-se dessa solução: a instalação
de bloqueadores de sinal (“jammers”) dos celulares, dentro dos presídios.
Logo que isso foi sugerido, não faltaram
“especialistas” que criticaram a proposta, alegando que esses bloqueadores, uma
vez operando, bloqueariam também os celulares dos diretores dos presídios, dos
bairros na vizinhança e até dos aviões que estivessem sobrevoando o
local…
E naturalmente, apareceram também os “filósofos”
alegando que sem celulares, os pobres presidiários, vítimas da sociedade
opressora, não poderiam socializar com suas famílias, cumprimentar suas avós
nas datas de aniversário delas e por aí adiante, em falsas narrativas.
Os governos, que somente pensam nos votos do amanhã ou
já são reféns do crime organizado, abandonaram a proposta, até hoje.
Mas hoje mudaram duas circunstâncias: primeiro, a
escalada dos “comandos” ultrapassou todos os limites de civilidade e
tolerância, e segundo a tecnologia aprimorou os aparelhos e é possível aplicar
seletivamente os bloqueios, sem interferências, riscos ou prejuízos a terceiros.
Se esses “jammers” fossem instalados, no dia seguinte
seria desfeita a rede eletrônica que comanda todos os crimes do país e está
sintonia com os demais cartéis do planeta.
Mas as “autoridades” querem? Ou são reféns, talvez
parceiros das mesmas quadrilhas?
*José Crespo é ex-prefeito de Sorocaba
(Os artigos assinados não representam,
necessariamente, a opinião do jornal)
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